el ruido de alguien conformandose

"- Sabe, eu tava pensando...
- Ih...
- Pra quê?
- Pra quê o quê?
- Pra que viver sabe? Pra que acordar, tomar banho, comer, estudar violão, teoria, harmonia, história, pra que fazer exercícios, correr de bicicleta, cuidar do que come, arrumar a casa, se arrumar...
- Tá, onde tu quer chegar?
- Mas-pra-quê? Pra-quê-tanto-céu, pra-quê-tanto-mar, pra quê?
- Aham...
- ... nascer, crescer, reproduzir e morrer. Lavar roupa...
- (suspiro)
- Qual a verdadeira chance de eu ser boa mesmo? Hein? Qual a chance de eu ser uma Baden do violão,
uma Jobim das melodias, das harmonias, dos arranjos, uma Vinícius dos poemas, uma João de gênio? Hein, qual-a-chance?
- É, é pequena.
- Depois eu tô velha já, cansada. Quer dizer, eu vou ser mais um ser humano por aí, que não fez a mínima diferença, além de ajudar no aumento do efeito estufa só por respirar. E nem isso eu tô fazendo direito, com essa gripe...
- Pois é, se mata então.
- Ah, falando nisso, nem te disse.
- O quê?
- Entrei num leilão daqueles bonequinhos antigos, sabe? Pô, brinquedo clássico dos anos 80...
- Sei, sei.
- Dei um lance. Cara, como eu quero esses bonequinhos!! Sério, eu morro se não ganhar!"